The Fundamentals of Caring

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Nota: 7.5

Ao término das seis semanas de seu curso de cuidador, Ben (Paul Rudd) é enviado para a casa de seu primeiro cliente, sobre o qual nada sabe. Ao ser entrevistado pela mãe, que desejava alguém com mais experiência, Ben é recebido com zombaria por Trevor (Craig Roberts), portador de Distrofia Muscular de Duchenne. O que, nos primeiros momentos, parecia ser uma relação complicada, logo transforma-se em amizade e cumplicidade, que mudará a vida de ambos para sempre. 

Mesmo com uma doença que diminuirá consideravelmente seu tempo de vida, Trevor segue uma vida extremamente regrada e metódica. Tem horários marcados para tudo, come somente waffles e salsicha, não sai de casa – exceto às quintas-feiras, quando vai ao parque das 14h às 15h – e não tem contato com pessoas além de sua mãe e seu cuidador. Sustenta sonhos que não tenta realizar, como ver o maior bovino do mundo e o poço mais profundo que existe, que estão a quilômetros de sua casa. A entrada de Ben na vida de Trevor não serve somente para “limpar sua bunda”, como o garoto insistentemente diz, mas para fazer com que ele não sucumbisse à doença e aproveitasse o tempo de vida que lhe restava. Então, os dois partem em uma viagem onde ambos encontram as descobertas e a liberdade de que tanto precisavam para viver melhor. 

O roteiro de The Fundamentals of Caring (2016), escrito pelo estreante Rob Burnett, é bem simples, e sustenta-se no clássico road movie que já conhecemos. A relação do cuidador com o garoto é explorada de maneira muito íntima, e rapidamente nos vemos envolvidos e nos importamos com o que está acontecendo na tela. Quando Dot (Selena Gomez) entra na viagem, apesar de haver uma quebra no paradigma do enredo – Trevor continua debochando de Ben a cada cena, mas vemos seu lado puxa-saco ser aflorado com a presença da jovem -, a narrativa não é quebrada, não há incômodo, uma vez que a personagem de Selena Gomez tem tanto carisma quanto os outros dois. A direção, também de Burnett, é eficaz, e colabora com o roteiro para a criação de uma história cativante. Os planos abertos, que mostram as paisagens pelas quais a van dirigida por Ben passa, são belíssimos, e dão um ótimo tom visual ao filme. 

Apesar de as atuações não serem o ponto alto do filme, o trio protagonista funciona bastante bem. Mesmo um tanto caricatos, os atores passam sensibilidade e aspereza na medida certa, e tornam aqueles personagens críveis. 

The Fundamentals of Caring é um filme que diverte bastante, tem piadas inteligentes, mas também faz pensar e emociona. Entrar na complicada realidade de Trevor pode ser incômodo, mas deixar-se viajar com seu grupo é uma experiência recompensadora, que resulta em uma ótima sensação que mostra o poder libertador que sair da mesmice e da rotina pode trazer.

Por Danilo Martins 

Notas Sobre um Escândalo

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Nota: 9.5

“Notas Sobre um Escândalo” (Notes on a Scandal, 2006) é um filme que tem como cenário principal uma escola no subúrbio de Londres, cujos alunos, desprivilegiados e marginalizados, não dão muita esperança aos professores. A maior prova dessa descrença é a chefe do departamento de história, Barbara Covett (Judi Dench), que não acredita na importância nem de um relatório preparado à diretoria. O longa é visto quase integralmente por meio de seus olhos julgadores e amargurados, que, por um lado, gostam do fato de serem temidos por todos, mas, por outro, têm pavor da solidão eterna de uma velhice sem familiares ou amigos verdadeiros.

O marasmo da escola é quebrado pela chegada de Sheba Hart (Cate Blanchett), professora de arte que chama atenção pela juventude, pela beleza e pelas tentativas frustradas de se encaixar em um lugar que claramente não lhe pertence. Os professores a invejam, e alguns a desejam; os alunos a desrespeitam, e alguns também a desejam. E a jovem professora não tem qualquer habilidade para lidar com isso. O fato é que a vida de Sheba, que, durante muito tempo, foi integralmente dedicada ao seu filho que tem Síndrome de Down, muda completamente quando se aproxima de Barbara, única professora que lhe dá abertura para iniciar uma amizade. Barbara, feliz por não ter mais uma vida fria, solitária e vazia, gosta da companhia e da juventude de Sheba, ao mesmo tempo em que a julga por praticamente tudo que faz, em que critica suas roupas e sua família. Sheba usa à exaustão a grande habilidade de Barbara de fazer com que pessoas lhe confidenciem segredos, até os mais constrangedores. Quando Barbara descobre o maior segredo de Sheba, o envolvimento amoroso e sexual com um de seus estudantes, percebe uma grande oportunidade para ter uma companheira para toda a vida.

Se, antes, a vida de Barbara era resumida à mão de ferro com que conduzia suas aulas e pela melancolia de sua vida pessoal, e a de Sheba era dominada por um casamento fracassado, sua aproximação traz consigo um verdadeiro tormento. A professora de história, ciumenta e possessiva, usa a chantagem para manter Sheba perto de si, que passa a viver constantemente sob pressão. O diretor Richard Eyre, um dos principais nomes do teatro britânico, é fantástico ao mostrar o sofrimento e a enorme tensão entre as duas. Com a câmera muitas vezes focando nos rostos e sua habilidade notável em criar forte inquietação com cenários claustrofóbicos, Eyre nos entrega uma direção admirável, e conduz um dos dramas mais angustiantes dos últimos tempos. Este é, sem dúvida, o melhor trabalho do diretor no cinema até hoje, e considero que uma indicação ao Oscar por sua direção seria merecida.

O roteiro adaptado por Patrick Marber é uma obra-prima. Os rumos que a história toma são muito mais importantes que o fato de Sheba ter se envolvido com seu aluno. A habilidade de focar na relação das duas mulheres e colocar o envolvimento de professora e aluno como um pano de fundo é fantástica, e considero um dos maiores acertos de Marber; saber o spoiler de qual é o segredo de Sheba não atrapalha, de maneira alguma, a experiência de assistir a “Notas Sobre um Escândalo”. Os diálogos são belíssimos, e temos algumas frases memoráveis ditas principalmente pela personagem de Judi Dench, como sua definição de como são os estudantes de sua escola e seus devaneios sobre a solidão eterna. Barbara, que, no início do longa, afirma que é ótima para guardar segredos, compartilha os seus conosco, e esse diálogo com o espectador é extremamente bem construído e viabilizado pelo roteiro. Não costumo gostar de personagens lendo cartas ou falando sozinhos, porém aqui temos uma aula de Patrick Marber de como fazer isso não ficar estranho ou brega. Vemos, neste filme, uma profunda discussão sobre poder e medo, em um longa com menos de 1 hora e meia de duração, o que é um feito impressionante. A indicação ao Oscar foi merecida, e acredito que talvez merecesse uma sorte maior na premiação, quando foi derrotado por William Monahan e seu “Os Infiltrados”. A trilha sonora, também indicada ao Oscar, e superada por “Babel”, é linda, tensa, uma das maiores responsáveis pela inquietude de quem assiste ao filme.

A escolha do elenco foi apenas mais um grande acerto deste filme praticamente sem falhas. Judi Dench e Cate Blanchett têm atuações impressionantes, quase pode-se notar as faíscas saindo quando elas dividem a mesma tela em seus momentos de conflito, e suas personagens são incrivelmente verossímeis. Dench nos mostra claramente o efeitos de uma relação doentia; todas as suas expressões se encaixam perfeitamente com os sentimentos e emoções de sua personagem, simplesmente não parece que temos, ali, uma atriz, e, sim, a própria Barbara Covett. A composição da personagem por meio da maquiagem e do cabelo contribuíram imensamente para que Dench estivesse espetacular em cena, e fosse indicada ao Oscar de melhor atriz. O mesmo pode-se dizer de Blanchett; a composição física da personagem foi menos complexa, mas sua atuação é no mesmo nível de Judi Dench, sobretudo em seus momentos mais difíceis, como quando deixa a casa da professora de história e enfrenta os repórteres. Cate Blanchett teve uma merecidíssima indicação ao Oscar de melhor atriz coadjuvante por uma das melhores atuações de sua carreira. O jovem Andrew Simpson e o veterano Bill Nighy, respectivamente amante e marido de Sheba Hart, também saem-se muito bem em seus papéis menores, mas não sem importância. O desejo declarado do garoto pela professora e a fúria do marido têm grande relevância para o desenvolvimento da história, e, até mesmo, para o desempenho de Dench e Blanchett, e os dois desempenham muito bem essas funções.

“Notas Sobre um Escândalo” pode ser considerado um filme completo, com grandes acertos em todos os aspectos. Diverte, emociona, inquieta, faz refletir. Em momento algum é moralista ou vai pelo caminho mais fácil. É, sem dúvida, um dos melhores filmes de 2006, e deve entrar, o quanto antes, na sua lista de filmes que devem ser vistos.

Por Danilo Martins

Inverno da Alma

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Nota: 7.5

O cinema independente é característico por baixo orçamento e uma exibição mais corajosa da realidade exposta no cinema comercial, principalmente hollywoodiano. Ainda que, nos dias de hoje, a primeira característica esteja perdendo força, a segunda ainda é constantemente explorada nos filmes independentes, o que os torna uma categoria “à parte” de todas as outras. E em 2010, um representante do bom, mas ainda deixado à margem pelos principais prêmios da sétima arte, cinema independente, conseguiu uma indicação ao inchado Oscar. “Inverno da Alma” (Winter’s Bone) é um filme franco, forte, mas que peca nos detalhes.

Ree Dolly (Jennifer Lawrence) é uma garota de 17 anos totalmente fora do estereótipo americano. Ela cuida de seus dois irmãos e de sua mãe doente como se fosse a própria “chefe de família”. Sua vontade e perseverança diante de uma realidade difícil (tanto financeira quanto em relação ao lugar onde vive, afastado de tudo) mostra sua maturidade ao longo da projeção, conferindo à personagem uma força que, costumeiramente, não é atribuída a atores/atrizes tão jovens. Seu pai, que não aparece em casa há um bom tempo, coloca a casa como garantia a problemas na justiça. Então, Ree recebe a visita de um policial que a avisa de que a casa será tomada; e que a única solução seria que seu pai se entregasse às autoridades, ou que ela provasse que ele estava morto. Começa, então, uma busca desesperada e agonizante da adolescente por seu pai, em uma jornada perigosa e reveladora.

O título em português, “Inverno da Alma”, confere ao longa uma força muito maior que o “Winter’s Bone” do título em inglês (que é, também, um spoiler de um dos principais acontecimentos do filme). “Inverno da Alma” vai além dos dramas/suspenses envolvendo busca que vemos sendo lançados todos os meses nas salas de cinema. A imprevisibilidade dá o tom da trama, que nos deixa sempre um passo atrás de Ree, que sabe muito mais do que acontece do que aparenta para o espectador. E isso torna o diálogo protagonista-espectador muito interessante, pois acompanhamos junto com ela o desvendar da história, nos sentimos parte da busca pelo pai, e criamos uma sincera empatia pela personagem. Ree mostra-nos que, mesmo em situações adversas (até aparentemente impossíveis), devemos continuar trilhando nosso caminho em busca de nosso objetivo, o que é um dos pontos mais fortes do filme. Além das soberbas atuações.

A jovem atriz Jennifer Lawrence, com 19 anos à época das filmagens, estava fazendo apenas seu segundo filme. Mas parecia uma veterana em ação. Tudo, desde suas expressões faciais aos tons de voz, estava perfeitamente encaixado com a proposta para a personagem. Ela faz com que realmente nos envolvamos fortemente com o longa, trazendo um pouco de “calor” ao inverno do título (e da projeção também, como falarei mais abaixo). Sua atuação é, sim, digna de indicação ao Oscar, apesar de ter me surpreendido particularmente. O ator mais conhecido do filme, tendo feito inúmeros trabalhos (como Miami Vice) antes de “Inverno da Alma”, é o ótimo John Hawkes. Interpretando Teardrop, tio de Ree, Hawkes consegue ter uma atuação ainda melhor que Jennifer Lawrence, roubando a cena para si em todos os momentos. Teardrop é um personagem característico desse tipo de filme: é o marginal de aspecto sujo que se contrapõe a nossa “heroína”, recusando-se a participar das buscas pelo pai da adolescente. Mas, com o passar do tempo, Teardrop é humanizado, o que mostra que a família ainda é uma instituição importante para o estranho homem.

“Inverno da Alma” é um filme de ritmo lento (o que, de fato, desagrada a maioria do público que espera uma busca frenética e cheia de ação), que foca na dor. E, por isso, houve um estranhamento geral da crítica em virtude de sua frieza. A força do filme, bem como de sua protagonista, traz o espectador para junto da trama, envolve-o, mas raramente o emociona. Embora a boa diretora Debra Granik, também dando seus primeiros passos na profissão, foque sempre sua câmera nos rostos sofridos dos habitantes do distante povoado, ela derrapa feio na transferência de emoção verdadeira para a tela. Percebemos o sofrimento do povo, vemos a força que isso traz ao filme, mas de algum modo nos sentimos distantes de sua realidade.

Ao final da projeção de “Inverno da Alma”, sentimos uma sensação de que o filme poderia ter ido além. Talvez com uma maior aproximação com o público não só por parte da protagonista, talvez com uma maior emoção passada pela direção e pelo roteiro. Percebe-se a vontade de todos de fazer o filme funcionar, percebe-se que aqueles atores desconhecidos da esmagadora maioria do público estão ali dando seu sangue, seu máximo. Entretanto, ao vermos o desenvolvimento da narrativa e dos personagens, terminamos com uma ponta de decepção, pois se perdeu uma grande chance de fazer uma obra-prima. Obra-prima, não; bom filme, sim.

Por Danilo Martins

Inferno

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Nota: 5.0

Você que já assistiu a “O Código Da Vinci” (2005) e a “Anjos e Demônios” (2009), sabe que a fórmula dos filmes adaptados da literatura de Dan Brown para o cinema é sempre a mesma. Robert Langdon (Tom Hanks), um famoso simbologista e professor de Harvard, sempre é convocado para resolver algum enigma relacionado à sua área de estudo, e acaba se envolvendo em um mundo de vários mistérios e conspirações. Acompanhado de um par feminino por onde passa, Langdon usa vastamente sua capacidade intelectual e seus conhecimentos de arte, história e símbolos, e consegue nos levar a boas soluções. As cidades históricas são um belo pano de fundo, com suas criptas, igrejas e grandes monumentos. No entanto, há um problema na fórmula de Dan Brown: ela não é inesgotável.

Em “Inferno” (idem, 2016), temos todos esses elementos. Langdon acorda em um hospital de Florença, na Itália, totalmente desnorteado, sem saber onde está. De posse de um objeto que interessa fortemente a organizações poderosas, o professor é perseguido desde dentro do quarto do hospital até o início do terceiro ato, em uma caçada que não se interrompe e não permite que o debilitado simbologista respire. Em sua fuga, Langdon desvenda mistérios da obra de Dante Alighieri, Inferno, buscando respostas para sua falta de memória e para compreender o motivo de estar sendo perseguido. A participação de Langdon na trama é muito menos interessante que a do genial geneticista Bertrand Zobrist (Ben Foster). “Inferno” é aberto com um arrebatador discurso seu a respeito dos malefícios do crescimento desordenado da população. Levando à risca a Teoria Malthusiana, Zobrist contou com a ajuda de uma misteriosa corporação para desenvolver a solução que salvaria a humanidade de sua extinção.

O maior problema de “Inferno” é explorar de maneira risível o mais interessante dos componentes da fórmula de Dan Brown: a mente de Langdon. É interessante a colocação do professor em uma situação de vulnerabilidade intelectual no início do filme – Langdon não consegue se lembrar a palavra para pedir um café -, mas são muito poucos os enigmas desvendados pelo personagem. A análise do “Mapa do Inferno” de Botticelli é rasa e apressada, a associação com o mural de Vasari é artificial e desconexa do “very sorry” dito por Langdon enquanto estava inconsciente no hospital, a importância da expressão “cerca trova” (“busca e encontrarás”, em italiano) é totalmente discutível. Langdon e sua parceira, Dra. Sienna Brooks (Felicity Jones), mostram que são bons em fugir de inimigos bem armados e equipados, mas são personagens substituíveis por quaisquer outros. Em determinada cena, é dito que sem o professor Langdon, ninguém pode encontrar a ameaça criada por Zobrist, mas é difícil acreditar nisso. É uma pena, uma vez que Langdon sempre contou com parceiras que, em conjunto com ele, davam um show intelectual. A Sienna do livro é uma mente brilhante; a do filme, só uma médica astuta.

A direção de Ron Howard é extremamente apressada e, conforme já mencionado, apresenta fugas intermináveis. Não temos tempo para pensar, nem os personagens, por isso a resolução de enigmas é rara e insatisfatória. Os planos abertos, bem explorados nos outros dois filmes, aqui são quase esquecidos – digo quase porque a visão da cisterna de Istambul é deslumbrante. Apesar disso, contamos com boas cenas, como a representação do inferno nas visões de Langdon, e a câmera na mão passa bem o senso de urgência da dupla protagonista. O período de desnorteamento de Langdon é muito bem executado por Howard, tanto com movimentos de câmera quanto de recursos auditivos. O roteiro, muito fraco apesar do bom livro de Dan Brown, apresenta soluções fáceis e simplórias. A descoberta dos planos de Zobrist por Langdon e Sienna dá-se num estalo, como se eles mesmos tivessem tido uma ideia repentina, totalmente sem fundamentação. O mesmo acontece quando a dupla encontra uma máscara que ajuda a resolver o enigma; Sienna não precisa refletir mais que dois segundos para concluir que ela estava coberta de gesso-cré, e que deveria ser passado sobre ela um pano com água. A preguiça de focar no mistério e o consequente excesso de “ação” torna o filme uma experiência cansativa. As reviravoltas e surpresas são interessantes, porém tudo é feito tão às pressas e sem ambientação que nem conseguimos digerir – afinal, tempo para apreender informações é algo que não dispomos ao assistir ao longa. Fica a impressão de que os imprevistos são todos gratuitos, feitos para impressionar, com pouco peso narrativo.

“Inferno” conta com um desenvolvimento de personagens fraco, e com atuações burocráticas, até mesmo de Tom Hanks e da ótima Felicity Jones. Não há verossimilhança, os diálogos são, muitas vezes, bobos, o que prejudicaria o trabalho do melhor dos atores. Há uma queda de qualidade absurda em relação aos dois filmes antecessores, que tiveram suas boas premissas executadas de maneira muito mais consistente e interessante. Não que “Inferno” seja um filme ruim, mas nunca alcança, nem de longe, todo seu potencial. O livro que originou o filme teve sua história modificada em alguns pontos-chave, que atrapalham a experiência como um todo e vão desagradar a quem já o leu. 

Mesmo com bons momentos na direção e de aspectos visuais, “Inferno” é só mais um filme que renderá boa bilheteria, mas que será esquecido em pouco tempo. Quanto ao ótimo Dan Brown, acredito que seja necessário explorar horizontes diferentes do professor Langdon, ou, ao menos, não autorizar sua adaptação para o cinema. Nos livros sua fórmula ainda funciona, mas nas telas já deu o que tinha que dar.

Por Danilo Martins


O Lar das Crianças Peculiares

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Nota: 5.5

A adaptação de livros de aventuras juvenis vem se consolidando como uma maneira segura para os estúdios de cinema faturarem altas cifras em bilheteria. Para o fim de 2016, a 20th Century Fox apostou em “O Orfanato da Senhora Peregrine para Crianças Peculiares”, best seller de Ransom Riggs, com milhões de cópias vendidas em 40 idiomas e considerado uma das 100 obras mais importantes de literatura jovem de todos os tempos. O universo bizarro criado por Riggs, que encanta pessoas de diferentes idades pelo mundo todo, tinha tudo para ser retratado de maneira inesquecível no cinema. Essa expectativa cresceu ainda mais depois do anúncio de que Tim Burton estaria na direção da obra. No entanto, nos deparamos com mais um filme decepcionante do diretor, que, desde “Sweeney Todd: O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet” (2007), só acertou com “Frankenweenie” (2012), e tem sua genialidade, antes unanimidade, cada vez mais questionada.

Em uma distante ilha no País de Gales, a Senhora Peregrine (Eva Green) dirige um orfanato cujas crianças são, de alguma forma, peculiares. Há uma menina que aquece (e incendeia às vezes) tudo que toca com as mãos. Há uma garotinha que possui uma boca voraz atrás da cabeça, e outra cuja força é descomunal. Há o rapaz que projeta seus sonhos nas paredes, também há um que dá vida a seres inanimados. Há a garota que precisa usar sapatos de chumbo para não sair voando por aí, além de “dominar o ar”, e há os gêmeos cuja peculiaridade fica oculta durante quase todo o filme e, por isso, não vou estragar a surpresa. A própria Senhora Peregrine tem sua peculiaridade: controla o tempo e é capaz de se transformar em águia. E há Jacob Portman (Asa Butterfield), que vai parar no local para tentar compreender o que houve com seu avô, misteriosamente morto em seu quintal. Aparentemente “normal”, Jake é apresentado a um mundo novo, no qual fendas no tempo não permitem que as pessoas saiam de determinada época ou dia, cujos olhos de peculiares são cobiçados por aqueles que desejam a imortalidade, e cuja complexidade mostrou-se demasiada para a roteirista Jane Goldman e o diretor Tim Burton transmitirem para a tela do cinema.

É simplesmente fantástico o mundo criado por Ransom Briggs. Não posso avaliá-lo mais profundamente pelo fato de ainda não ter lido o livro, porém percebe-se que há uma bela construção de lógicas e regras próprias do universo dos peculiares e dos etéreos, que, infelizmente, não foram transpostas para o cinema de maneira satisfatória. Muito pouco sobre a pessimamente resolvida fenda no tempo é explicado com clareza suficiente para não ser necessário parar muitas vezes de prestar atenção ao filme para tentar entender o que acabou de acontecer. Ela é segura, mas como um etéreo entrou nela? Que história é essa de ela ter sido criada no momento perfeito? O que é o momento perfeito? Além disso, ao final do filme não fica clara a real função da fenda no tempo, uma vez que ela se mostra desnecessária para a maioria das coisas. Os etéreos, construídos em linda computação gráfica, não são explorados com clareza – eles são comedores de olhos ou “fornecedores”? Há uma correria desnecessária com a narrativa, o que impede que consigamos acompanhar bem  o que se passa na tela e, principalmente, torna forçadas algumas situações – o que é esse embuste de romance entre Jake e Emma (Ella Purnell)?

Há, ainda, algumas incoerências. Emma é a personagem que domina o ar, mas não consegue sustentar o vilão Barron (Samuel L. Jackson) por tempo suficiente em uma cena próxima do final do filme. Se ela domina o ar, não deveria ter poderes ilimitados sobre ele?  Também é provável que você questione como os poderes dos peculiares levantaram um navio naufragado; em um filme de fantasia é normal o uso desses poderes, mas o que acontece é inconcebível até para os X-Men juvenis de “O Lar das Crianças Peculiares”. 

Depois de um bom desenvolvimento inicial da narrativa, onde são apresentados os fatos que nos deixam interessados em continuar assistindo à jornada de Jake, o filme acaba se perdendo com ausência de explicações, como já foi mencionado acima. No entanto, é desrespeitado um dos princípios básicos para a existência de uma narrativa: o arco. Arco narrativo é aquilo pelo qual o personagem passa durante uma narrativa e que provoca uma mudança profunda em sua essência, em sua identidade. A inexistência de uma mudança profunda, no mínimo no personagem principal, torna desnecessária a existência de uma narrativa – dificilmente alguém terá interesse em acompanhar a história de um homem que acorda triste um dia, passa por diversas aventuras, e vai dormir triste, da mesma maneira. Isso acontece claramente em “O Lar das Crianças Peculiares”. Jake não encontra seu arco narrativo, não passa por uma mudança considerável em seu estado. E este é, na minha opinião, o maior pecado do longa: levar-nos do nada a lugar nenhum, colocando lindas cenas no meio.

Como em todo filme de Tim Burton, temos em “O Lar das Crianças Peculiares” um deleite visual. O ar sombrio do filme, as cores acinzentadas com a invasão de cores vivas em determinados momentos (principalmente o verde), além da direção de arte extremamente competente, fazem deste o filme de Burton visualmente mais impactante desde Sweeney Todd. Apesar dos diversos equívocos do diretor, há um ponto louvável em seu trabalho: por meio de sua câmera, somos facilmente imersos no mundo dos peculiares, e, por mais confuso que esse universo possa parecer, nos sentimos parte dele. Sobretudo, nos interessamos por ele. Os peculiares não são super-humanos, estão sujeitos a falhas – é impagável ver Jake tentando acertar flechas nos etéreos – e acabamos nos identificando bastante com eles.

As atuações dos atores são bastante destoantes e irregulares. Asa Butterfield alterna momentos em que parece estar totalmente perdido em cena com outros em que domina bem seu personagem. Sua atuação, no geral, é decepcionante, principalmente se comparada ao seu papel de maior relevância (Hugo Cabret, em “A Invenção de Hugo Cabret”). Eva Green é um monstro em cena, icônica, lembrando (e superando) bastante o Willy Wonka de Johnny Depp. Samuel L. Jackson tem um personagem aquém de sua capacidade, e possivelmente irá se arrepender no futuro de ter feito este trabalho. Isso sem falar em Judi Dench, que fez uma ponta constrangedora no filme, um papel irrelevante, que jamais deveria ser interpretado por uma atriz deste gabarito.

“O Lar das Crianças Peculiares” é um filme que diverte. A imersão neste novo mundo é feita de maneira habilidosa, há bom diálogo dos personagens com o público e a parte visual é linda. No entanto, o fã de Tim Burton, ou somente aquele que ainda acredita no trabalho do diretor, ficará frustrado quando começarem a aparecer os créditos finais. Resta saber quando será a recuperação de um cineasta tão talentoso, mas que dá sinais claros de que está perdido na carreira.

Por Danilo Martins

Truque de Mestre

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Nota: 5.5

Golpes divertidos + ritmo alucinante + excelentes interpretações + roteiro raso e limitado. Essa é a fórmula que levou “Truque de Mestre” (Now you see me, 2013) a arrebatar espectadores, arrecadar mais de US$ 350 milhões, receber uma cretina continuação em 2016 e a promessa de mais uma, programada para estrear em 2017. O filme segue pelo caminho mais seguro que poderia encontrar para o sucesso, faz muito bem o que se propõe a ser e, se não for encarado com muita seriedade, garante um ótimo divertimento. 

A história gira em torno do quarteto formado por Daniel Atlas (Jesse Eisenberg), Henley (Isla Fischer), Merrit (Woody Harrelson) e Jack (James Franco). Atlas é um mágico com alguma fama, Henley é sua ex-assistente que conseguiu seguir uma boa carreira solo como mágica. Jack usa seus poderes de ilusionismo para praticar pequenos furtos, enquanto Merrit é um mentalista especializado em hipnose, e também lança mão de seus poderes para enganar pessoas. 

Os quatro têm suas vidas mudadas quando são convocados por uma pessoa misteriosa que lhes incube a missão de expandir os horizontes de suas magias. O quarteto, que recebeu o nome de “Os Quatro Cavaleiros”, passa a fazer shows onde roubam bancos, cofres e contas bancárias repletas de dinheiro. Ciente do poder dos ilusionistas, que fizeram milhões de reais sumirem de um banco em Paris e pararem nas mãos da plateia do show ocorrido em Las Vegas, o FBI destina o agente Dylan Rhodes (Mark Ruffalo) para a missão de capturar o quarteto. Para tanto, conta com a ajuda da jovem agente francesa da Interpol, Alma (Mélanie Laurent), e do ex-mágico Thaddeus Bradley (Morgan Freeman), que largou sua carreira para desmascarar truques de ex-colegas de profissão. 

A premissa de “Truque de Mestre” é muito interessante. Os mágicos conseguem encantar a própria plateia presencial e quem está assistindo pelas telas, de tão engenhosos e incríveis que são seus truques. O problema é que, muitas vezes, o encantamento não é suficiente. Na maior parte do longa, somos hipnotizados pelas cenas muitíssimo bem dirigidas pelo competente Louis Leterrier. O diretor, responsável por filmes bem recebidos pela crítica como Carga Explosiva e Cão de Briga, imprimiu um ritmo frenético às cenas, o que cai muito bem ao filme, uma vez que isso consegue mascarar para os menos exigentes os graves problemas que o terrível roteiro possui.

Não é possível levar “Truque de Mestre” a sério. Se você tiver isso em mente, vai conseguir aproveitar os méritos do filme. No entanto, não há como deixar de comentar sobre o roteiro, que eu considero uma brincadeira de mau gosto. As mágicas feitas pelos Quatro Cavaleiros são dignas das aulas de Feitiços de Harry Potter – talvez nem em Hogwarts uma mulher saia voando dentro de uma bolha de sabão -, e não há como aceitá-las em um filme que não se rotula dentro do gênero “fantasia”. Algumas situações simplesmente são inadmissíveis, como uma perseguição muito semelhante ao game GTA, onde o carro que persegue sempre está no encalço do perseguido, independentemente de outros carros que se colocam no caminho ou de freadas bruscas que ocorrem. O personagem de Morgan Freeman é mais onisciente que o Deus interpretado pelo ator em “Todo Poderoso”; somente isso justifica que ele sempre saiba exatamente o que os mágicos fizeram em seus golpes, estando ciente de informações que são impossíveis que ele conheça. Há, ainda, um acidente cuja explicação é muito difícil de engolir, e só é aceito pelo público em virtude de um bem executado truque de câmera de Leterrier – este, o melhor mágico do filme, sem sombra de dúvida. Somando isso à canalha revelação final, que em nada acrescenta à experiência, além de inúmeros outros problemas, temos um roteiro sofrível, e não inteligente como pode parecer à primeira vista e sem prestar muita atenção.

Em uma narrativa, o autor deve conhecer profundamente seus personagens, para que haja verossimilhança e uma boa construção da história. No entanto, parece que os três roteiristas de “Truque de Mestre” – Ed Solomon, Boaz Yakin e Edward Ricourt – nem se deram o trabalho de desenvolver uma história para seus personagens. Não se sabe absolutamente nada sobre os mágicos, apenas que eles fazem mágicas; nada sobre os investigadores, apenas que eles investigam; nada sobre o ex-mágico, apenas que ele resolveu se diferenciar dos demais e ganhar mais dinheiro desvendando truques. Há uma preguiça surreal do trio de roteiristas em fazer seus personagens serem críveis, e um uso descarado de clichês na apresentação dos mesmos. O chefe do grupo, o excluído do grupo – quem assistir ao filme olhando no celular de vez em quando só vai notar a presença do personagem de James Franco no final do longa -, a investigadora bonitona, o investigador desesperado que não vê saída para a resolução do problema. Apesar disso, contamos com atuações muito boas de todos os atores, que compraram a ideia do filme e fizeram excelente trabalho – sobretudo os sempre ótimos Jesse Eisenberg e Woody Harrelson.

O público que busca entretenimento não irá se incomodar com os diversos problemas de “Truque de Mestre”. Como já mencionado acima, é um filme feito para se divertir, e atinge seu objetivo para aqueles que o assistem sem muitas expectativas. A direção delirante e ótima, associada a uma montagem ágil e não tão boa assim, além dos bons atores, proporciona uma boa experiência no geral, e salva o longa de um total fracasso. 

Por Danilo Martins

12 Horas para Sobreviver: O Ano da Eleição

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Nota: 8.0

O sucesso da cinessérie The Purge ao redor do mundo, principalmente nos Estados Unidos, é evidente desde o primeiro filme, lançado em 2013. Com o orçamento de “Uma Noite de Crime” (The Purge) na ordem de US$ 3 milhões originando um faturamento de bilheteria de quase US$ 90 milhões, era evidente uma continuação. “Uma Noite de Crime – Anarquia” (The Purge – Anarchy, 2014) mostrou-se um filme infinitamente mais competente que seu antecessor em todos os aspectos, o que não pode ser justificado somente por questões orçamentárias – foram gastos US$ 9 milhões para a realização da continuação -, mas pelo conjunto da obra. Não é de surpreender que uma nova sequência fosse feita, e “12 Horas para Sobreviver: O Ano da Eleição” (The Purge – Election Year, 2016), chegado ao Brasil nesta quinta-feira (06/10), não decepcionou.

Este terceiro filme ocorre dois anos após o segundo. Como de hábito, há o evento anual chamado “the purge”, ou “a noite da purga”: uma noite em que, por 12 horas, qualquer crime é permitido, incluindo assassinato. É ano de eleição nos Estados Unidos, e a noite da purga é o principal motivo da grande polarização entre os dois candidatos: o religioso Edwige Owens (Kyle Secor) e a Senadora Charlie Roan (Elizabeth Mitchell). Enquanto Owens acredita que a noite da purga é essencial para a purificação da alma dos americanos, que extravasam seus maus sentimentos durante essa noite onde tudo é permitido, a Senadora Roan prega que a selvageria é dispensável e promete acabar com o evento. Em seu discurso, Roan deixa claro que os interesses para a criação da noite da purga são unicamente destinados ao extermínio dos mais pobres, que não têm como se proteger, e cuja morte seria um alívio às contas e às políticas sociais do país. No entanto, a Senadora precisa sobreviver aos ataques de seus opositores nessa noite para colocar em prática seus ideais, e deverá contar fielmente com seu segurança particular, Leo Barnes (Frank Grillo), o sargento que buscava vingança no segundo filme.

O mérito de “12 Horas para Sobreviver” está, principalmente, no fato de conseguir explorar nuances inéditas da franquia. Enquanto o primeiro filme mostrou uma visão mais intimista da noite de crime, sob o ponto de vista de pessoas ricas que conseguiam se proteger e tiveram suas fragilidades expostas, o segundo abordou aqueles menos favorecidos que precisam ficar nas ruas e participar da purga, este terceiro foi além ao explorar o mundo de quem está por trás do evento anual. O foco no caráter político eleva o potencial de debate da cinessérie, trazendo à tona definitivamente a questão social; o mundo das gangues, os interesses de quem apoia a purga, as pessoas que buscam vingança, aquelas que têm algo além de suas vidas ameaçado pelos crimes autorizados, e aquelas que, ao contrário da maioria da população, resolve fazer o bem na noite de crime. É possível ver “12 Horas para Sobreviver” como um estudo sociológico de uma realidade que, mesmo distópica, tem uma maior aproximação ao nosso mundo do que podemos querer admitir.

Mesmo tendo sido filmado muitos meses antes do início efetivo da corrida eleitoral americana, é possível ver claramente as semelhanças entre os candidatos da ficção e Hillary Clinton e Donald Trump. Coincidência, ou não, isso garante ao filme um interesse ainda maior daqueles que estão por dentro dos acontecimentos nos Estados Unidos da realidade, e é mais um ponto favorável ao roteiro de James DeMonaco.

Além da qualidade do debate proposto por DeMonaco, o roteiro tem muitos outros acertos, bem como a direção do mesmo DeMonaco. É possível ver o tempo inteiro a insanidade da população, tanto nos momentos em que vemos pessoas atacando umas às outras, gritando e dançando ao redor de corpos, tanto quando são mostrados os bastidores da purga. Os planos mais fechados de DeMonaco, que podem ser vistos negativamente no sentido de expor o baixo orçamento do filme – com apenas US$ 10 milhões é difícil encher as ruas com pessoas loucas sedentas por sangue -, foram um grande acerto na minha opinião. Podemos ver nos olhos das pessoas as suas motivações, construídas culturalmente ao longo do tempo e autorizadas por quem tem o domínio do país, e isso nos permite entrar mais a fundo na história. No entanto, esses mesmos planos fechados podem passar um pouco menos tensão e sensação de urgência, porém nada que comprometa o resultado final.

O filme conta com boas atuações, sobretudo da dupla de protagonistas – Mitchell e Grillo. Os personagens, cuja construção é absolutamente satisfatória, todos têm relevância, e o elenco dá conta de transmitir as emoções duais e difíceis de quem vive em uma noite onde tudo é permitido. O figurino também é digno de elogios; as cores vibrantes, presentes em muitas das máscaras e fantasias usadas pelos participantes da purga, servem perfeitamente para mostrar o caráter sádico e insano dos personagens, principalmente aquela que busca vingança a todo custo, e aquela que ilustra essa publicação. Os atos de violência também são muito bem representados visualmente, com mortes caprichadas e muito sangue voando pela tela.

“12 Horas para Sobreviver: O Ano da Eleição” consolida a franquia como parte relevante do cinema americano, e mostra que consegue se renovar a cada filme. Aqui não temos um salto de qualidade em relação a “Anarquia”, mas isso em nada não depõe contra o longa. É uma pena que sua precária distribuição brasileira o tenha levado a tão poucas salas. O Brasil também trouxe ao filme seu maior pecado: a horrível tradução, que pode deixar o público confuso quanto ao pertencimento à franquia The Purge. Tendo estreado nos Estados Unidos no início de julho, este terceiro filme apresenta ótimo rendimento de bilheteria – faturou, até o momento, mais de US$ 115 milhões -, e acredito que a franquia ainda tenha fôlego e história suficientes para ganhar mais uma continuação. Resta-nos esperar para ver, e torcer para que o potencial de renovação, mostrado a cada novo filme, seja mantido e explorado.

Por Danilo Martins

O retorno (pra valer dessa vez)

Pouco mais de oito anos atrás, foi escrita a primeira crítica deste blog. O filme contemplado foi Jogos Mortais, meu favorito à época, e confesso não ter sido dos meus melhores textos. Com o tempo, o blog foi melhorando, passando a ser um pouco mais conhecido, recebendo mais visitas e comentários. Até que, quando estava em bom momento, este que vos escreve decidiu largar tudo. Obrigações foram surgindo, o tempo tornou-se escasso, e foi quase inevitável deixar este blog de lado, por mais que fosse difícil.

Foram seis anos de hiato. Recentemente, me bateu saudade de escrever aqui, e, quando entrei na área de edição do blog, tive uma surpresa enorme: ele continuava sendo visitado e, por mais incrível que possa parecer, o número de visitantes e de visitas aumentou assustadoramente. Senti um orgulho enorme por meus textos continuarem sendo lidos, por pessoas continuarem levando minhas opiniões em consideração, e por continuarem interagindo neste espaço pelo qual sinto tanto carinho. O crescimento do blog, mesmo sem interferência minha, me deu o ânimo que faltava para eu voltar pela segunda vez, e continuar expressando aqui minhas percepções sobre filmes bons, médios e ruins, sempre com o máximo de sinceridade e buscando o maior apuro técnico possível.

A cara do Cinema Levado a Sério mudou, e algumas mudanças mais virão. Mas não vou dar spoiler, porque sei o quanto isso é péssimo! Por isso, peço que você continue me acompanhando, pode ter certeza de que vai valer a pena.

Sejam bem-vindos de volta!

Caso 39

Nota: 8,5

Os inúmeros problemas de pós-produção de “Caso 39” (Case 39, 2009) são um fato nada chamativo para o longa. Arrecadando apenas US$ 14,6 milhões ao redor do mundo, o filme começou a ser produzido em 2009, teve a estréia adiada várias vezes e, ao meu ver, passou a despertar menos interesse do público. No entanto, mesmo após mexerem e remexerem cenas e a montagem, este longa de estréia do diretor alemão Christian Alvart, mesmo utilizando um gênero já bastante explorado (o de crianças más, representado otimamente pelo recente “A Órfã”), consegue agradar bastante com uma trama ágil e despreocupada com passar a realidade o tempo todo para o espectador.

Emily Jenkins (Renée Zellweger) é uma assistente social extremamente dedicada que recebe de seu chefe seu 39º caso, referente à garotinha Lilith Sullivan (Jodelle Ferland), bastante anti-social e estranha. Aparentemente tratada com violência por seu pais, Lilith caiu muito de rendimento na escola e não dormia mais. Os temores de Emily são confirmados quando precisa salvar a garotinha de uma tentativa de assassinato por parte de seus pais, que tentam matá-la queimada em um forno.  Emily, então, decide cuidar pessoalmente de Lilith até que surja uma família para adotá-la. Mas é aí que o terror começa…

Com um início no melhor estilo devagar-quase-parando, a trama de Caso 39 é monótona em seus minutos iniciais. No entanto, após o primeiro evento-chave, a história toma um rumo interessantíssimo, mesmo com um fraco desenvolvimento de personagens do início do filme. Alvart consegue criar um clima de tensão bastante eficiente, através da boa fotografia e de bastante ousadia. Os momentos de devaneio da protagonista (muito bem feita por Renée Zellweger) são totalmente realistas, e não passam com um piscar de olhos. Esse é, talvez, o maior acerto do filme, que dá origem a cenas realmente assustadoras. A cena do armário, situada próximo aos momentos finais do filme, é uma das melhores da projeção em virtude desse recurso muito bem utilizado pelo diretor estreante. Nesse filme, terror físico e psicológico estão unidos de tal maneira que, por vários momentos, não conseguimos diferenciar o que é o quê. Há de se destacar, também, o fator psicológico da protagonista que, ao mesmo tempo em que tem certeza do que está acontecendo, tem sua sanidade posta em cheque como na cena descrita anteriormente.

O modo como Alvart mata seus personagens também é interessantíssimo. Não, não é inovador, mas também não é uma cópia dos trocentos filmes iguais que vemos por aí ao longo dos anos. As pessoas não recebem ligações da Samara dizendo que morrerão dentro de 7 dias nem cometem suicídio por causa de um vírus que está no ar; há lógica, há tensão, há medo. Além do modo, as mortes em si são bastante estilosas, com total destaque para a primeira. Apesar de ter pontos fortes em número muito maior que os fracos, Caso 39 bóia em seus clichês. Como sempre, há a pessoa desesperada, a pessoa que não acredita em nada e diz que a que acredita está louca e por aí vai. No entanto, Alvart também sabe surpreender seu espectador, como acontece no final do filme. O diretos nos mostra como transformar em surpresa algo que parecia óbvio, presenteando-nos com um final digno do restante de seu longa: de tirar o fôlego.

Do elenco de Caso 39, os únicos atores que eu conhecia anteriormente eram Renée Zellweger (de Cold Montain e Bridget Jones) e Bradley Cooper (do ótimo O Último Trem). Surpreendi-me bastante com o funcionamento de todo o elenco em cena, entrosados e envolvidos na trama. Renée está OK como protagonista, por vezes exagerando nos tons de voz e expressões faciais, mas acertando na maioria das vezes. Kerry O’Malley e Callum Keith Rennie, que interpretam os pais de Lilith, vão muito bem com o papel de pais insanos da garota, transmitindo um realismo bastante desagradável (no melhor sentido da palavra). Bradley Cooper, interpretando Doug, amigo e flerte de Emily, vai muito bem, confirmando totalmente minhas impressões a seu respeito tiradas do filme O Último Trem. Mas a maior surpresa, novamente, está na “garotinha do demônio” interpretada pela muito competente atriz Jodelle Ferland. Em seu oitavo filme, a atriz canadense de apenas 14 anos tem carisma e consegue transmitir tudo de que sua personagem precisa para passar o medo necessário ao bom andamento do longa. Com mais este nome, a nova geração de atores (muito bem representada por Nathan Gamble e Isabelle Fuhrer, dentre o que me lembro agora) promete retomar aos velhos tempos, em que, para ser ator ou atriz, era necessário ser bom, não só ter beleza como está sendo a nova moda de Hollywood.

Caso 39 é mais uma das agradáveis surpresas, um terror acima da média que não é atrapalhado por seus clichês. Muitos acertos, poucos erros e um filme imperdível para quem gosta do gênero. Grande acerto do então estreante diretor Christian Alvart.


Acompanhe o Oscar em tempo real

Neste domingo, dia 7 de março, às 22h (horário de Brasília), acontecerá a maior premiação do cinema, o Oscar 2010. Diferentemente do ano passado, não farei um especial do Oscar com apostas neste blog, mas farei um acompanhamento em tempo real através de meu twitter, postando os indicados, meus favoritos, resultados e comentários. Não deixem de acompanhar! O endereço está abaixo!

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Vejo vocês no domingo!