Inferno

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Nota: 5.0

Você que já assistiu a “O Código Da Vinci” (2005) e a “Anjos e Demônios” (2009), sabe que a fórmula dos filmes adaptados da literatura de Dan Brown para o cinema é sempre a mesma. Robert Langdon (Tom Hanks), um famoso simbologista e professor de Harvard, sempre é convocado para resolver algum enigma relacionado à sua área de estudo, e acaba se envolvendo em um mundo de vários mistérios e conspirações. Acompanhado de um par feminino por onde passa, Langdon usa vastamente sua capacidade intelectual e seus conhecimentos de arte, história e símbolos, e consegue nos levar a boas soluções. As cidades históricas são um belo pano de fundo, com suas criptas, igrejas e grandes monumentos. No entanto, há um problema na fórmula de Dan Brown: ela não é inesgotável.

Em “Inferno” (idem, 2016), temos todos esses elementos. Langdon acorda em um hospital de Florença, na Itália, totalmente desnorteado, sem saber onde está. De posse de um objeto que interessa fortemente a organizações poderosas, o professor é perseguido desde dentro do quarto do hospital até o início do terceiro ato, em uma caçada que não se interrompe e não permite que o debilitado simbologista respire. Em sua fuga, Langdon desvenda mistérios da obra de Dante Alighieri, Inferno, buscando respostas para sua falta de memória e para compreender o motivo de estar sendo perseguido. A participação de Langdon na trama é muito menos interessante que a do genial geneticista Bertrand Zobrist (Ben Foster). “Inferno” é aberto com um arrebatador discurso seu a respeito dos malefícios do crescimento desordenado da população. Levando à risca a Teoria Malthusiana, Zobrist contou com a ajuda de uma misteriosa corporação para desenvolver a solução que salvaria a humanidade de sua extinção.

O maior problema de “Inferno” é explorar de maneira risível o mais interessante dos componentes da fórmula de Dan Brown: a mente de Langdon. É interessante a colocação do professor em uma situação de vulnerabilidade intelectual no início do filme – Langdon não consegue se lembrar a palavra para pedir um café -, mas são muito poucos os enigmas desvendados pelo personagem. A análise do “Mapa do Inferno” de Botticelli é rasa e apressada, a associação com o mural de Vasari é artificial e desconexa do “very sorry” dito por Langdon enquanto estava inconsciente no hospital, a importância da expressão “cerca trova” (“busca e encontrarás”, em italiano) é totalmente discutível. Langdon e sua parceira, Dra. Sienna Brooks (Felicity Jones), mostram que são bons em fugir de inimigos bem armados e equipados, mas são personagens substituíveis por quaisquer outros. Em determinada cena, é dito que sem o professor Langdon, ninguém pode encontrar a ameaça criada por Zobrist, mas é difícil acreditar nisso. É uma pena, uma vez que Langdon sempre contou com parceiras que, em conjunto com ele, davam um show intelectual. A Sienna do livro é uma mente brilhante; a do filme, só uma médica astuta.

A direção de Ron Howard é extremamente apressada e, conforme já mencionado, apresenta fugas intermináveis. Não temos tempo para pensar, nem os personagens, por isso a resolução de enigmas é rara e insatisfatória. Os planos abertos, bem explorados nos outros dois filmes, aqui são quase esquecidos – digo quase porque a visão da cisterna de Istambul é deslumbrante. Apesar disso, contamos com boas cenas, como a representação do inferno nas visões de Langdon, e a câmera na mão passa bem o senso de urgência da dupla protagonista. O período de desnorteamento de Langdon é muito bem executado por Howard, tanto com movimentos de câmera quanto de recursos auditivos. O roteiro, muito fraco apesar do bom livro de Dan Brown, apresenta soluções fáceis e simplórias. A descoberta dos planos de Zobrist por Langdon e Sienna dá-se num estalo, como se eles mesmos tivessem tido uma ideia repentina, totalmente sem fundamentação. O mesmo acontece quando a dupla encontra uma máscara que ajuda a resolver o enigma; Sienna não precisa refletir mais que dois segundos para concluir que ela estava coberta de gesso-cré, e que deveria ser passado sobre ela um pano com água. A preguiça de focar no mistério e o consequente excesso de “ação” torna o filme uma experiência cansativa. As reviravoltas e surpresas são interessantes, porém tudo é feito tão às pressas e sem ambientação que nem conseguimos digerir – afinal, tempo para apreender informações é algo que não dispomos ao assistir ao longa. Fica a impressão de que os imprevistos são todos gratuitos, feitos para impressionar, com pouco peso narrativo.

“Inferno” conta com um desenvolvimento de personagens fraco, e com atuações burocráticas, até mesmo de Tom Hanks e da ótima Felicity Jones. Não há verossimilhança, os diálogos são, muitas vezes, bobos, o que prejudicaria o trabalho do melhor dos atores. Há uma queda de qualidade absurda em relação aos dois filmes antecessores, que tiveram suas boas premissas executadas de maneira muito mais consistente e interessante. Não que “Inferno” seja um filme ruim, mas nunca alcança, nem de longe, todo seu potencial. O livro que originou o filme teve sua história modificada em alguns pontos-chave, que atrapalham a experiência como um todo e vão desagradar a quem já o leu. 

Mesmo com bons momentos na direção e de aspectos visuais, “Inferno” é só mais um filme que renderá boa bilheteria, mas que será esquecido em pouco tempo. Quanto ao ótimo Dan Brown, acredito que seja necessário explorar horizontes diferentes do professor Langdon, ou, ao menos, não autorizar sua adaptação para o cinema. Nos livros sua fórmula ainda funciona, mas nas telas já deu o que tinha que dar.

Por Danilo Martins


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